terça-feira, 21 de dezembro de 2010

As quedas da Universidade de São Paulo

O NaMaria News reproduz, solenemente, matéria de Conceição Lemes, do Viomundo (em 20/12/2010).
Depois, há umas colocações complementares de nossa própria lavra.



Há tempos se ouvem rumores de que a qualidade de ensino das universidades estaduais paulistas está em queda. A Science Magazine, de 2 de dezembro, aumentou a suspeita. Na reportagem de seis páginas dedicada à ciência brasileira — foi a principal da edição — a Universidade de São Paulo (USP), apesar de ter grande produção científica, não teve nenhuma pesquisa destacada.

A reportagem começou e terminou por Natal (RN). Mais precisamente no município Macaíba, que sedia o Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond e Lilly Safra, mais conhecido como Centro do Cérebro, implantado pelos neurocientistas Miguel Nicolelis e Sidarta Ribeiro.

A reportagem destacou também, entre outras, as pesquisas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), da Petrobras e da Amazônia.

A mídia brasileira, exceto o Correio Brasiliense [leia aqui], ignorou solenemente a edição 331 da Science, que foi festejada no exterior por cientistas que torcem pelo sucesso do Brasil. Pudera. A Science é a mais prestigiosa revista de ciência do mundo, ao lado da Nature, inglesa.

Por que essa conduta, afinal a reportagem da Science foi um gol de placa da ciência brasileira?

Como o feito merecia supercobertura da mídia nativa, só restam hipóteses para o descaso com que tratou a façanha. Mesquinhez? Incompetência? Miopia jornalística? O fato de um projeto inovador de ciência estar brotando no Nordeste e não no Sul do Brasil? Façam as suas apostas.

Pior fez a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo — Fapesp. Proibiu a sua agência de divulgar a proeza brasileira na Science. Inveja pela USP não ter sido destacada? Bancar avestruz como se não houvesse ciência de ponta sendo feita no Brasil além de São Paulo?

Mas nada como um dia após o outro. A verdade aparece. Documento obtido pelo Viomundo (está abaixo) mostra que o processo de declínio na qualidade da USP é mais intenso do que até os próprios críticos da USP no mundo acadêmico imaginavam.

O documento em questão é um relatório de avaliação institucional feito pela equipe do reitor da USP, professor João Grandino Rodas, assinado pelo vice-reitor e pelos pró-reitores e enviado por e-mail a todos os docentes e funcionários.

"A antiga reitora, Suely Vilela, instituiu um prêmio de excelência acadêmica, que, na prática, é um bônus em dinheiro para a comunidade da USP", explica-nos um funcionário da universidade. "Só que este ano não foi concedido. A explicação está na insuspeita confissão da equipe do professor Rodas, demonstrando que, na atual gestão, a USP perdeu várias posições no ranking acadêmico. É o resultado da implantação dos métodos da gestão tucana na Universidade."

O e-mail enviado aos professores está abaixo. Atente. Nos diversos ranqueamentos acadêmicos de universidades importantes no mundo, a USP perdeu posições em todos, exceto no ranking HEEACT, de Taiwan. No WEBOMETRICS, a USP caiu da posição 38ª, no segundo semestre de 2009, para 122ª, no segundo semestre de 2010. Ou seja, rodou 84 posições escada abaixo.


(clique na imagem para ampliá-la)


PÉSSIMA NOTÍCIA PARA O RODAS: UNIVERSIDADE DO MÉXICO SUPERA A USP

Webometrics, como já dissemos, é um dos ranqueamentos acadêmicos de universidades no mundo. Se considerarmos apenas a América Latina, a USP está em segundo lugar. A primeira em qualidade é a Universidade Nacional Autônoma do México.


(clique na imagem para ampliá-la)

Inegavelmente, uma péssima notícia para o reitor João Grandino Rodas, ex-diretor da Faculdade de Direito da USP, o segundo colocado da lista tríplice apresentada pelo Conselho Universitário ao então governador José Serra (PSBD). Mesmo sendo o segundo, ele foi escolhido como reitor.

O professor Rodas segue à risca a filosofia do PSDB. Com avaliação institucional, a USP deixou de pagar o bônus aos professores e funcionários e ainda os chamou de incompetentes.

O professor Rodas adota também a cartilha tucana de administração, pautada pela ausência de diálogo com a comunidade acadêmica e os funcionários.

Um de seus últimos atos de 2010 foi processar 24 alunos por militância política, o que tem motivado protestos na USP, como o Ato contra a Criminalização da Política e a recente moção da Congregação da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas.

Será que a USP ainda tem jeito? Será que vai reverter esse quadro desalentador?

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PS: por NMN

O PSBD e a revolucionária metodologia pedagógica do CRÉU NELES

O Webometrics, como disse a Conceição Lemes, é um dos ranqueadores mundiais do ensino universitário, nele pode-se também ver o ranque mundial de 12 mil universidades. Na carta ilustrada acima (originalmente pode ser vista aqui), são citados outros indicadores que você pode percorrer e analisar algumas conjunturas da queda livre em que a USP está metida:

  • Academic Ranking of World Universities (ARWU) - Ranking Shangai
    • Aspectos interessantes. Ao buscar "Brazil", obtemos 4 resultados:



    • O primeiro deles refere-se à UNESP, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, de onde o futuro governador Geraldo Alckmin (PSDB) retirou o então reitor (campus Guaratinguetá) e futuro secretário de Educação do Estado de São Paulo, Sr. Herman Jacobus Cornelis Voorwald, engenheiro mecânico. A situação da UNESP não é das melhores no mundo, consta entre os lugares 301-400, porém melhorou em relação a 2009, quando estava entre 402-501. Entretanto, ainda atrás das Universidades Federais de Minas Gerais e Rio de Janeiro em alguns critérios. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul está entre as posições 401-500 do mundo. Caso queira ver os dados ARWU de 2009, entre aqui.


  • Higher Education Evaluation and Accreditation Council of Taiwan - HEEACT

    • No release de 15/setembro/2010 (abre em doc. Word), dizem na página 2:

      Among the North & Latin American universities of the 2010 top 100, the leading universities of each country are: USA’s Harvard University (1st), Canada’s University of Toronto (9th), and Brazil’s University of São Paulo (74th). In Asia/Pacific region, the leaders are: Japan’s University of Tokyo (14th), Australia’s University of Melbourne (43rd), South Korea’s Seoul National University (67th), and Singapore’s National University of Singapore (84th)
      .

    • Para confirmar os dados acima, basta entrar em 2010 Performance Ranking of Scientific Papers for World Universities, e escolher Top 100, por exemplo.

    • Além da USP na 74ª posição do mundo e 47ª nas Américas (com nota de 22.74), vê-se através do ranque Norte e América Latina a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na 419ª do mundo e 167ª regional; Rio de Janeiro na 341ª colocação e 144ª na regional. A Universidade Estadual de Campinas (SP) está na 345ª casa (146ª regional). Depois a UNESP ocupando a 424ª colocação, sendo 170ª na regional. A Universidade Federal de Minas Gerais está na 475ª (188ª regional), seguida pela Universidade Federal de São Paulo, na 483ª (189ª regional).

    • Estas são as posições das sete melhores universidades no Brasil, pelo HEEACT



    • Como são gente fina, nos dão graciosamente uma lista de links de instituições que avaliam o ensino universitário pelo mundo - onde não consta qualquer uma no Brasil. (A Avalia, do Sr. Paulo Renato Costa Souza (futuro ex-secretário da Educação de SP para 2011, ainda não chegou lá.)

  • Times Higher Education Supplement (THE World University Ranking)

    • O Brasil não aparece na lista das universidades Top 200 de 2010, em 2009 idem. Para nos confirmar na posição de número 232, é necessário baixar o APP para IPhone e ver as Top 400.

    • Há, entretanto, uma análise das universidades sul-americanas, incluindo brasileiras como a USP, UNICAMP (Campinas): The goals will come, de 16/setembro/2010, por Phil Baty. Diz ele, primeiro mordendo e depois soprando, que

      Unlike their football teams, South America's universities have not made a global splash. But Brazil looks likely to score some big successes soon. The continent of South America does not have a single institution in the Times Higher Education list of the world’s 200 top universities. And those institutions most likely to break into the elite list, according to one expert, are hampered by a number of obstacles in their climb to the top. (...)

      It is in the life sciences that Brazil is most impressive. Between 2003 and 2007, the country published about 85,000 papers, which accounted for 1.83 per cent of all the papers published in journals indexed by Thomson Reuters.
      But Brazil accounts for almost 19 per cent of the global share of research papers in tropical medicine, and more than 12 per cent of those in parasitology.

      In its report, Thomson Reuters warns: “Brazil is an increasingly important and competitive research economy. Its research workforce capacity and R & D investment are expanding rapidly, offering many new possibilities in a rapidly diversifying research portfolio. Brazil’s profile, improving excellence, size and interface with the rest of the international research base make it an essential partner in any future international research portfolio.

Conceição Lemes nos relembra o jeitinho tucano da meritocracia - que poderia ser realmente proveitosa, não fosse o método Créu Neles, que a transforma em punição e desonra. Tal inovadora metodologia pedago-científica consiste em primeiro fazer promessas para calar ânimos exaltados devido a tantos maus tratos profissionais de anos e anos. Professores universitários insatisfeitos, depois de muitas idas e vindas negociadoras (e pacíficas), acreditaram que um bônus lhes seria dado, não um aumento efetivo, se acalmaram. Chegou a época do pagamento e cadê a promessa cumprida? A reitoria manda a cartinha acima e dá um baita créu neles: são ineptos, não cumpriram metas internacionais, vagabundearam e, portanto, não merecem nada. Assim é fácil. A comunidade acadêmica vai ficar quietinha, concordando? Então.

Bem que poderiam criar um tipo de Saresp só para as universidades paulistas, especialmente a USP, a ser aplicado como nas escolas públicas de ensino médio e fundamental. Assim, os melhores receberiam altos bônus, se esforçariam para melhorar as aulas e tudo mais de excelente que sabemos acontecer com os participantes do Saresp. Paulo Renato comeu bola?

Luz no fim do túnel?

O pessoal otimista da USP e alhures pode e vai responder a pergunta do Viomundo "há salvação?" com um grande sim. Principalmente se eles se prenderem ao que nos mostra o Webometrics em Country Scoreboard.
Não seria justo, então, pagar o bônus prometido ao pessoal?

Ali, depois de cálculos refinados (QS SAFE National System), chega-se à conclusão de que o Brasil ocupa a décima posição mundial.

Quer dizer, dos países que têm universidades entre as primeiras 500 colocadas, o nosso Brasil fica bem na fita. Tão bem que está acima do Japão, Itália, França, China, Chile, Argentina, Índia etc., só perde para países como Estados Unidos (primeiro em todos os ranques), Alemanha, Reino Unido, Canadá, Espanha Austrália, Suécia, Holanda e Suíça. (Em análises de outras organizações, contudo, estamos em posições de maior desvantagem.)

Mais é menos

Tudo isso nos faz pensar na proliferação pesada das universidades no Brasil, graças aos hercúleos esforços do então ministro Paulo Renato, no MEC - governo Fernando Henrique Cardoso -, a fim de levar educação a quem fosse, mas deixando a qualidade em planos secundários.

Nosso próximo passo será analisar as universidades, sobretudo as privadas, começando pelas paulistas, e localizá-las nos ranques mundial e nacional, quando possível.

Logo de cara, pelo mesmo Webometrics, sabe-se que aqui há 1.494 instituições catalogadas por eles. No Top 100 Brasil, o Centro Universitário Nove de Julho (UNINOVE) é a última colocada, sendo que no mundo está na 3.628ª posição. O mote da campanha publicitária deles não poderia ser o que é - ela não é "dez", é menos cem.

Imagine as outras universidades que se multiplicaram por aí.
Imagine a fábrica de dinheiro em nome da "educação para todos".
Imagine as relações e interesses político-pessoais pelo caminho.
Imagine a qualidade profissional no mercado de trabalho.
Imagine que tudo isso poderia ser diferente.
Mas essa será outra história.

PS² - Só mais uma pergunta. Na carta temos isto:
III. – No que toca ao indicador – Avaliação e cumprimento dos planos de metas – Comissão Permanente de Avaliação – CPA
A CPA não dispõe de indicadores que possam ser utilizados para uma avaliação anual.
Então para qual finalidade serve uma Comissão Permanente de Avaliação?

5 comentários:

  1. O único alívio que tenho é Serra não ter ganho as eleições. Se isso ocorrese, pimba!, privatização na certa. Agora, o jeito é volta com os movimentos estudantis, que não devem parar nunca. O jeito é revolução.

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  2. Os Tucanos acabarm com a Educação agoram vão exportar doente para outros estados, olhem a noticia http://www.viomundo.com.br/denuncias/governador-alberto-goldman-quer-vender-ate-25-dos-leitos-hospitalares-do-sus-em-sp.html

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  3. A preocupação continua.
    Alckmin ganhou e isso quer dizer um mau negócio para São Paulo, os tucanos ainda são uma ameação para os espaços sociais dos Paulistas, na educação, saúde, judiciário, saneamento, segurança etc
    São Paulo está sendo vendida, é uma triste constatação realista.
    As imobiliárias estão de olho no campus da USP, e a mídia tem grande interesse em dividir a educação na privataria.
    Quem não enxerga?

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  4. Olá Namaria,

    primeiramente parabéns por esse insitgante e importantíssimo blog.

    Aqui foi o único lugar onde vi que a FAPESP vetou a divulgação da matéria da Science. Parabéns pelo furo!

    Gostaria porém de comentar sobre essa questão da USP e dos rankings. acho que no geral sua matéria aponta corretamente que a gestão Rodas nada faz para melhorar a situação da USP e que a ausência de diálogo é extremamante desmotivante e paralizante.

    Toda a sua análise vai na direção correta sim, mas acho que não convém enfatizar tanto o resultado do Webometrics. Esse ranking mede apenas o impacto das universidades na rede e no passado colocou a USP num improvável 38 lugar do mundo. Essa colocação era irrealista e essa "queda vertiginosa" é mais uma colocação da USP numa posição mais condizível com sua relevância mundial. Acho muito mais preocupante as pequenas mas consistentes quedas nos demais rankings.

    Como na universidade existe uma massa inercial muito grande, qualquer queda que experimentamos em 2010, foi forjada não apenas na (péssima) gestão Rodas, mas também na anterior. Essa gestão, por exemplo, convocou a PM para reprimir movimentos grevistas no campus, algo que foi tremendamente desmoralizante para todos na USP.

    Do mesmo modo, quaiquer iniciativas positivas tendem a dar frutos numa escala de tempo de alguns anos.

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  5. Eu que fui aluno do curso de História na FFLCH da USP vejo com pesar e muito desânimo o atual rumo seguido pela USP.

    Vai levar anos para ela voltar para o caminho do saber e da produção científica voltada para o Brasil.

    Temos mais quatro anos de penumbra a enfrentar: o governo do Alckimin.

    A perspectiva com o governo do PSDB não é nada boa para a USP, para a educação paulista, para o Estado de São Paulo, para os servidores públicos de São Paulo e para a sociedade paulista.

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